Entidades apresentam ao governo uma Proposta Unificada para Implantação de Sistemas de Logística Reversa para Equipamentos Eletroeletrônicos.

No início deste ano, a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), a Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), Associação Brasileira de Supermercados (Abras), o Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), a Associação Brasileira dos Distribuidores de Tecnologia da Informação (Abradisti) e o Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviços Móvel, Celular e Pessoal (SindiTelebrasil), representando, respectivamente, fabricantes, comércio, distribuidores e operadoras de celular, protocolou junto ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), a Proposta Unificada para Implantação de Sistemas de Logística Reversa para Equipamentos Eletroeletrônicos.

O documento aborda aspectos importantes a serem superados para a implantação da logística reversa e garantir segurança a todos os agentes da sociedade – consumidores, comerciantes e distribuidores, fabricantes e importadores.

Seis pontos foram destacados na proposta:

Essas questões foram apresentadas e discutidas durante a reunião do Comitê Orientador para Implantação de Sistemas de Logística Reversa (Cori), que é presidido pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) e composto por mais outros quatro ministérios: o de Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior (MDIC); o da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa); o da Fazenda (MF); e o da Saúde (MS).

Após análise técnica da proposta, o MMA encaminhou à Abinee ofício de resposta afirmando que o documento apresentado pelas entidades mostra evolução em relação às propostas apresentadas em 2013 e que as seis questões ainda pendem de resolução.

No entanto, o MMA afirmou que os temas extrapolam o quesito meramente ambiental e, dessa forma, decidiu que os ministérios membros do Cori fossem, também, oficiados individualmente sobre as questões, para que contribuam, dentro de suas competências, com o processo de negociação em curso. Assim, o assunto está no aguardo do posicionamento dos demais ministérios para discussão e definição com as entidades envolvidas.

Para André Luís Saraiva, diretor da área de Sustentabilidade da Abinee, o posicionamento do MMA mostra que a Proposta Unificada está na direção correta, contribuindo para a efetiva implementação dos sistemas de logística reversa. “É essencial, no entanto, que os pontos apresentados pelos fabricantes, comércio, distribuidores e operadoras de celular sejam solucionados para a viabilização de todo o processo”, reforça Saraiva.

Como forma de contribuir para as discussões sobre a implementação dos sistemas de logística reversa, a Revista Abinee propôs quatro questões endereçadas a agentes públicos e entidades privadas. Atenderam ao convite, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), por meio do seu gerente técnico Carlos Thadeu de Oliveira, com a colaboração de João Paulo Amaral, pesquisador em Sustentabilidade, e o Instituto Ethos, entidade que visa disseminar a prática da responsabilidade social empresarial, por meio de Daniela Damiati, coordenadora de Políticas Públicas.

Leia a seguir a entrevista.

Revista Abinee Após a publicação e regulamentação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), em 2010, alguns Estados e municípios se anteciparam às discussões do acordo setorial previsto na lei federal e passaram a publicar leis para recolhimento e destinação correta dos produtos. Algumas dessas medidas divergem da PNRS e outras trazem novos aspectos, gerando grande apreensão entre as empresas. Diante desse fato, o que deve ser feito para conciliar as inúmeras legislações, convergindo-as para a lei de abrangência nacional?

Idec – A PNRS prevê que podem (e devem) existir políticas locais e regionais e isso certamente vai exigir arranjos adaptados às diferentes realidades. E esses atores locais e regionais devem, também, estar atentos a que esses arranjos não repousem em patamares inferiores ao que exige a lei federal, pois é assim num sistema federativo como o nosso. Do mesmo modo, as autoridades federais devem estar atentas para que certas exigências não inviabilizem a adoção das políticas em nível local e a consequente adesão de todos os atores. Isso significa que certamente será preciso rever pontos tanto na esfera federal como na local e regional, a fim de chegarmos a um padrão comum, seguro e viável. Este é o momento e o grande desafio das autoridades. Os próprios acordos setoriais devem estar alinhados com essa realidade.

Ethos – É ótimo quando os Estados são proativos e se antecipam na discussão de uma determinada política pública. No caso de resíduos, como a lei demorou mais de duas décadas para ser aprovada, muitos Estados e municípios fizeram sua própria legislação, o que é positivo e legítimo. No entanto, com a aprovação da PNRS, ela passa a ser soberana e então os Estados e municípios que têm leis divergentes devem se adequar. O mesmo vale para os acordos setoriais. Os Estados e municípios que quiserem se antecipar já poderiam fazer ajustes para alinhar seus programas, acordos e políticas de forma a não haver divergências e o governo federal poderia também instaurar um grupo de trabalho com os Estados para discutir sobre a harmonização de suas políticas de resíduos sólidos.

Revista Abinee – Quais são os mecanismos para garantir uma isonomia no cumprimento das responsabilidades da logística reversa dos eletroeletrônicos, envolvendo todos os atores, inclusive os não signatários do acordo setorial, e evitar desequilíbrios competitivos?

Idec – Os setores devem se mexer a fim de incluir o máximo de atores nos acordos. Portanto, a tarefa inclusiva inicial é do setor privado. Mas como, mesmo assim, é possível supor que haverá sempre aquele que não quer investir e se adaptar, será necessário o Estado entrar em cena e utilizar os instrumentos legais para tanto. Isso não precisa ser feito necessariamente no âmbito da própria legislação específica da PNRS. Em outras palavras, talvez não seja necessário que todos os acordos terminem em decretos. Porque o governo dispõe de instrumentos variados, cuja aplicação concorre para a consecução da PNRS. São instrumentos no plano da política ambiental e da política comercial, entre outros.

Ethos – O importante é que, quando o acordo seja fechado, já se estabeleça a responsabilidade de todos os atores, como a indústria, o comércio, distribuidores, importadores, catadores de materiais recicláveis e consumidores. Para que haja isonomia é importante que todos sejam envolvidos; caso contrário, alguns atores poderiam de fato ganhar uma vantagem competitiva a curto prazo, por falta de compromisso com a lei.

Revista Abinee – Hoje, a implantação da logística reversa está diante de temas complexos a serem superados, tais como, entre outros, o reconhecimento da não periculosidade dos eletroeletrônicos pós-consumo, o documento único e simplificado para transporte e mecanismos de compensação e custeio para produtos órfãos. Vocês acreditam que esses desafios serão solucionados até a assinatura do acordo?

Idec – A esperança de todos nós é que sim. Sabemos que não é fácil a tarefa, pois implica abrir mão, recuar em determinados momentos, avançar em outros. Creio que a superação dos obstáculos na área ambiental não é fácil, mas com bom senso de ambos os lados, podemos conseguir. O mais difícil, acredito, será na área fiscal e tributária. Se não conseguirmos superar o máximo das divergências até a assinatura do acordo, corremos o risco de haver medidas posteriores que trarão mais deformações à já complicadíssima estrutura fiscal e tributária brasileira.

Ethos – O governo e o setor empresarial precisam trabalhar juntos para superar tais desafios. O ideal é que o tempo da resolução desses entraves coincida com o fechamento do acordo, mesmo porque, dependendo do modelo do acordo setorial que for acertado, será obrigatório que essas questões estejam resolvidas. A PNRS demorou anos para ser aprovada e, nesse meio tempo, tanto o governo quanto o setor privado avançaram pouco nessa agenda. Então agora é hora de todos trabalharmos juntos para viabilizar sua implantação, ainda que isso exija alguns ajustes nos prazos.

Revista Abinee – Como levar os consumidores a participar efetivamente da logística reversa, sendo que são eles os responsáveis pelo início de todo o processo?

Idec – O processo será paulatino e, na verdade, tem um importante vetor já na produção e venda dos produtos. É preciso garantir informação de fácil compreensão e buscar o máximo de capilaridade nos pontos de coleta ou mesmo de recolhimento dos produtos. Se o consumidor gozar de relativo conforto e conhecimento, ele aderirá, mesmo com algum custo. São necessárias campanhas de informação no início do processo, que sejam repetidas de tempos em tempos. Nesse ponto, o setor privado pode ajudar muito, assim como o poder público, claro. Por quê? Porque as empresas estão em contato permanente e diário com os consumidores. É muito mais direto quando o consumidor recebe uma mensagem da empresa da qual acabou de comprar o produto e mais eficaz do que esperar que o poder público faça isso. Hoje, o poder da comunicação com o consumidor está maciçamente na mão da iniciativa privada, desde a publicidade até o rótulo do produto. Deve-se levar isso em consideração.

Ethos – A melhor forma de engajar os consumidores é mostrando resultados efetivos. A comunicação com esse público precisa ser clara e abrangente. Os consumidores têm de ser bem informados sobre suas responsabilidades e sobre como será o processo de logística reversa. Quanto mais eles perceberem os resultados da logística reversa, mais vão se engajar para agir de acordo com o que se espera deles.

Matéria publicada originalmente na Revista Abinee, nº 75, de março de 2014.