O foco, neste caso, é o respeito aos limites do planeta, o que significa produzir e consumir de acordo com os recursos que a Terra pode fornecer.
Por Jorge Abrahão*
Na semana passada, comentamos neste espaço que várias entidades da sociedade civil, inclusive o Instituto Ethos, estão construindo uma Agenda Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável com o objetivo de apresentá-la aos candidatos a presidente e governador. A ideia é que tais candidatos ou candidatas se comprometam com algumas diretrizes e metas que estimulem o desenvolvimento sustentável no país.
E, conforme afirmamos, vamos comentar com um pouco mais de profundidade cada um dos temas gerais dessa agenda. Assim, começamos por meio ambiente, cujo foco central é o respeito aos limites do planeta.
Essa ideia parte do princípio de que nós não somos donos, mas inquilinos do planeta Terra. Dependemos da água, do solo, do ar que só ele nos fornece. Mesmo a recente descoberta de outro corpo celeste parecido com o nosso planeta não resolveria o problema da sobrevivência da nossa espécie, em caso de colapso da Terra, pois ele está a 490 milhões de anos-luz do nosso Sistema Solar.
Ocorre que os recursos do nosso planeta são finitos, mas o consumo humano não tem parado de crescer. Entre 1800 e 2010, a população pulou de 1 bilhão de pessoas para 7 bilhões. A economia aumentou 50 vezes, mas à custa da pauperização do planeta. Uma forma de verificar esse empobrecimento é medir a quantidade de hectares globais (hga) de solo e água necessários para suportar o consumo atual da população, a chamada “pegada ecológica”. A Terra tem 13,4 bilhões de hga de solo e água ecologicamente produtivos.
Em 2010, a Global Footprint Network informou que a pegada ecológica da humanidade era de 2,7 hga por pessoa, em 2007, para uma população de 6,7 bilhões de pessoas, segundo a ONU. Isso significa que seriam necessários 18,1 bilhões de hga para sustentar todos esses habitantes – quase um planeta e meio. Com uma pegada de 2,7 hga por pessoa, em média, o planeta deveria ter, no máximo, 5 bilhões de habitantes.
O professor José Eustáquio Diniz Alves, doutor em demografia da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence), do IBGE, fez um cálculo da pegada ecológica média por região, com base nos dados do Global Footprint Network de 2010.
A maior é a dos Estados Unidos e do Canadá, com 7,9 hga, que suportaria 1,7 bilhão de pessoas no planeta, um pouco maior do que a população mundial em 1800. As menores pegadas são as dos continentes africano e asiático, com 1,4 hga e 1,8 hga, respectivamente, garantindo a sobrevivência de 9,6 bilhões de habitantes, no primeiro caso, e 7,4 bilhões, no outro.
Com a pegada da Europa, de 4,7 hga, o planeta não poderia ter mais de 2,9 bilhões de habitantes. A Oceania tem uma pegada maior que a da Europa, de 5,4 hga, com a qual o planeta suportaria uma população de 2,5 bilhões de pessoas.
Finalmente, a América Latina possui uma pegada um pouco abaixo da média mundial – 2,6 hga –, com a qual seria possível uma população de 5 bilhões de pessoas.
O que se pode concluir desses números?
Em primeiro lugar, que a desigualdade joga um papel fundamental no “equilíbrio” ecológico do mundo. Em segundo lugar, se as projeções da ONU estiveram corretas, em 2050 a população mundial deve chegar a algo entre 8 bilhões e 10 bilhões de pessoas. Mantendo o mesmo modelo de produção e consumo, a desigualdade será muito maior, os recursos naturais estarão ainda mais escassos e o planeta chegará ao limite de sua capacidade.
Ou seja, não há como manter os atuais padrões de consumo e produção. Por isso, a Agenda Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável preconiza, como forma de respeitar os limites do planeta, a promoção de uma economia de baixo carbono, com a conservação e uso sustentável da biodiversidade e serviços ecossistêmicos e dos recursos hídricos, e com a implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).
As ideias da agenda
O Brasil deveria promover uma economia de baixo carbono como diferencial competitivo, principalmente em negociações internacionais. Também podemos desenvolver uma estratégia nacional de redução de emissões, por exemplo, com ampliação do investimento em fontes alternativas de energia limpa ou em transporte coletivo de boa qualidade, como trens interestaduais mais rápidos, para estimular viagens por esse meio de transporte, e não de carro.
Outras ideias da agenda remetem a: investimento na ampliação da matriz energética brasileira, buscando fontes alternativas de energia limpa; promoção da conservação e uso sustentável da biodiversidade e serviços ecossistêmicos, com a instituição do marco regulatório do pagamento por serviços ambientais (PSA), entre outros avanços institucionais; uso sustentável dos recursos hídricos; e implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Qual o papel das empresas?
As boas práticas ambientais das empresas ajudam o mercado a avançar e podem contribuir para influenciar políticas públicas. O Brasil já possui um bom grupo de empresas com estratégias e práticas socioambientais que as distinguem no mercado. Citamos, por exemplo, aquelas que integram a carteira do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), da BMF&Bovespa.
A pergunta que sempre se faz é se elas valem mais do que uma empresa, digamos, “comum”. Um estudo global feito pela consultoria Aon para a Wharton School norte-americana avaliou 361 empresas abertas de vários países e 25 setores da economia, segundo maturidade de gestão de riscos sociais e ambientais, entre outros. No Brasil, a consultoria verificou o desempenho do ISE, desde sua fundação, em 2005, até o dia 14 de abril de 2014, comparando-o com o Ibovespa, no mesmo período. O resultado: o Ibovespa acumulou ganho de 62,51% e o ISE, de 142,7%.
A diferença mostra, justamente, que os investidores já entendem que empresas mais sustentáveis não apenas possuem menor exposição ao risco como também estão mais bem posicionadas para aproveitar as oportunidades no longo prazo e para liderar as transformações pelas quais a sociedade brasileira precisa passar.
* Jorge Abrahão é diretor-presidente do Instituto Ethos.