Nota faz oposição ao uso que se tem dado às chamadas emendas de relator no âmbito das dinâmicas que passaram a ser conhecidas como Orçamento Secreto¹
19/11/2021
Embora as emendas de relator sejam instrumento com previsão e regulação legal e regimental, resta evidente que têm sido desvirtuadas para atender interesses incertos por meio da transgressão aos postulados da transparência, da publicidade, da moralidade, da impessoalidade e da eficiência na gestão dos recursos públicos.
O modo como essas indicações ocorrem impede a identificação dos parlamentares autores dos repasses. A inobservância de critérios e a falta de transparência sobre tais parcelas bilionárias do orçamento público impedem que a sociedade acompanhe como são utilizadas e dificulta enormemente a atuação dos órgãos de controle, conforme já reconhecido pelo próprio Tribunal de Contas da União em diversas oportunidades ².
Também é necessário registrar que, ao contrário do que ocorre com as demais modalidades de emendas, e com o que deveria ocorrer em relação às emendas de relator, o uso atual desse instrumento não se pauta por critérios objetivos mínimos que necessariamente devem orientar a utilização do dinheiro público, o que viola também a impessoalidade, na medida em que tais recursos podem assim ser direcionados unicamente ao atendimento de interesses pessoais e político-eleitorais dos parlamentares beneficiários.
Esse contexto compromete gravemente a própria democracia, uma vez que tais repasses podem ser livremente direcionados apenas àqueles parlamentares que se submetam às pretensões de quem os controla, prejudicando não apenas os divergentes, mas toda a população que eventualmente deixa de contar com políticas públicas que seriam realizadas caso o mecanismo das emendas parlamentares fosse corretamente utilizado.
A integridade também fica comprometida na medida em que foram revelados fortes indícios da aquisição de bens superfaturados com o uso de recursos oriundos das emendas de relator, o que torna ainda mais grave a violação da moralidade na gestão desses recursos.
Assim, a eficiência das políticas públicas também é atingida, uma vez que o interesse público impõe que sejam construídas a partir de critérios objetivos e impessoais, e na medida do possível acordados coletivamente, que busquem a racionalidade e a correção dos gastos públicos.
É certo que o orçamento público guarda certa margem de discricionariedade como instrumento de autonomia, independência e fortalecimento do debate político nas escolhas em matéria de políticas públicas, desde que sejam respeitadas as regras para tanto estabelecidas pelo próprio Congresso Nacional.
Não se pode admitir, no entanto, que o mecanismo em comento seja utilizado para beneficiar individualmente agentes públicos apenas a partir de seus interesses político-eleitorais, em detrimento de toda a população que sofre com a ausência de investimentos financeiros e se encontra à mercê das mudanças legislativas pautadas por expedientes antidemocráticos.
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Foto: Unsplash
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