Por: Caio Magri, diretor-presidente do Instituto Ethos
Em julho deste ano, a capital do Pará, Belém, recebeu a I Semana do Clima da Amazônia, uma iniciativa inédita dedicada à escuta e ao debate acerca das soluções climáticas construídas com e para os povos da região amazônica. Como parte das atividades que antecedem a 30ª Conferência sobre Mudanças Climáticas (COP30) da Organização das Nações Unidas (ONU), que será realizada em novembro na mesma cidade, a Semana contou com cerca de 30 eventos autogerenciados, isto é, organizados por instituições da sociedade civil, movimentos sociais, Poder Público, universidades e lideranças locais. O resultado foi um espaço plural de escuta e mobilização que conectou saberes tradicionais, ciência e políticas públicas.
A essência da Semana era estimular diálogos improváveis entre atores que nem sempre estão sentados à mesma mesa. E deu certo! Essa primeira edição — que deve se tornar anual — promoveu trocas essenciais sobre os papéis social e ambiental das empresas com relação aos territórios onde atuam, habitados muitas vezes por povos tradicionais que devem ser respeitados.
Dessas dezenas de painéis e encontros, surgiram desafios e oportunidades de aproximação entre empresas e territórios. No entanto, ainda persiste a dificuldade de diálogo entre empresas e comunidades locais. José Ivanildo Brilhante, diretor financeiro da Executiva Nacional do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), ilustrou bem esse desafio, destacando como práticas empresariais ainda fragmentam os territórios tradicionais, impondo ritmos diferentes às comunidades. Essa realidade revela a persistência de uma lógica colonial, com decisões que desconsideram contextos locais, o que exige das companhias escuta ativa, adaptação e respeito para que a sua atuação seja legítima e alinhada com os interesses comunitários.
Por outro lado, o evento deu visibilidade às iniciativas do setor corporativo que vêm avançando no reconhecimento de seus impactos socioambientais e na busca por soluções em diálogo com os territórios. A disposição de algumas organizações para aproximarem-se diretamente das comunidades, evitando o uso de intermediários, foi um dos sinais mais promissores. Esses esforços indicam a construção de um oásis de boas práticas e a possibilidade de superação de barreiras.
Os fortalecimentos da transparência e da participação social nas decisões que afetam o meio ambiente tornaram-se um tema transversal. A ratificação do Acordo de Escazú, tratado internacional que garante o acesso à informação, à participação pública e à justiça em questões ambientais, foi apontada como um passo essencial para consolidar uma governança ambiental democrática na América Latina e no Caribe.
Num contexto em que o Brasil sediará a COP30 em poucos meses, e diante da crescente complexidade dos crimes ambientais e seus efeitos socioeconômicos e institucionais — exemplo disso é a recente votação no Congresso do Projeto de Lei (PL) 2.159/2021, que fragiliza o licenciamento ambiental no País —, o Acordo de Escazú é estratégico para o fortalecimento da governança ambiental na proteção dos que atuam em sua defesa, bem como para a consolidação de uma agenda de desenvolvimento sustentável pautada pela justiça, pela cooperação regional e pela paz social nos territórios.
A integração entre transparência pública e responsabilidade corporativa na disponibilização de dados ambientais, confiáveis e acessíveis à sociedade, e o estímulo à participação ativa da sociedade civil — na formulação, no monitoramento e no controle de políticas públicas ambientais — são alguns dos pontos defendidos e que convergiram também nas trocas realizadas na Semana do Clima.
Conscientes do papel transformador que o setor empresarial pode exercer, as discussões enfatizaram a urgência de práticas corporativas que vão além da mitigação de danos, incorporando também esforços consistentes de adaptação às mudanças climáticas e avançando para modelos de regeneração e integração com o ecossistema local. Essa conjuntura demanda, por parte das empresas, não apenas compromissos públicos, mas ações com lastro territorial, propósito legítimo e respeito às diversidades socioculturais.
A I Semana do Clima da Amazônia representou um avanço relevante na consolidação de uma cultura de diálogo. Contudo, os aprendizados apontam para a necessidade de continuidade, ampliação e qualificação desses espaços. A inclusão de novos públicos, o fortalecimento da escuta e o compromisso com a justiça climática devem guiar os próximos passos.
Ainda em 2025, o Instituto Ethos promoverá a 26ª edição da Conferência Ethos, um espaço de referência para a promoção do desenvolvimento sustentável e para a construção de alianças entre os diversos setores. Além de temas transversais sobre o clima, o evento também contará com um painel sobre a responsabilidade corporativa com o desenvolvimento sustentável nos territórios, com o objetivo de aprofundar reflexões, dar visibilidade a experiências concretas e fortalecer a participação social na agenda climática.
Organizações comprometidas em promover integridade socioambiental precisam estar abertas à escuta e à realização de ações coordenadas entre todos os atores. Para isso, será necessário reconfigurar os modos de atuação, os sistemas de governança e os modelos de desenvolvimento que historicamente têm aprofundado desigualdades. A Semana do Clima da Amazônia foi um passo importante nessa direção. Que nas próximas oportunidades haja ainda mais comprometimento com o presente e com o futuro, unindo desenvolvimento, justiça climática, bem-estar coletivo e sustentabilidade a longo prazo.

 
     
                     
                     
                    






