O aquecimento global tornou-se enfim um fenômeno de percepção global nesta sexta-feira (5). Os organizadores da Olimpíada do Rio aproveitaram a audiência cativa de mais de 3 bilhões de pessoas na cerimônia de abertura dos jogos para dar uma aula de por que o planeta está esquentando, o que está em jogo se não agirmos — e mais ou menos o que dá para fazer a respeito.

Foram cinco minutos de um vídeo produzido pelo cineasta Fernando Meirelles (diretor de Cidade de Deus), projetado na imensa tela na qual o piso do Maracanã foi convertido para a festa. Do degelo do Ártico aos recordes de temperatura deste século, do aumento do nível do mar à importância das florestas para o ciclo de carbono, estava tudo lá. Todas as mensagens importantes que os cientistas tentam entregar desde 1990, quando o IPCC (o painel do clima da ONU) começou a publicar seus relatórios, foram transmitidas na abertura, com forte impacto visual, para mais ou menos literalmente meio mundo. Foi provavelmente a maior audiência da história para a temática do clima.

“Então, uma versão da minha espiral de aquecimento global acaba de ser usada na abertura dos Jogos Olímpicos. Caramba”, tuitou o climatologista britânico Ed Hawkins, da Universidade de Reading, ao ver pela transmissão da BBC uma animação produzida por ele neste ano e que se tornou a imagem climática mais compartilhada do mundo. O gráfico, em forma de espiral, mostra o crescimento das temperaturas da Terra desde a era pré-industrial até os dias de hoje, em razão das emissões de carbono causadas pela queima de combustíveis fósseis e pelo desmatamento.

O vídeo mostrou a conexão entre o uso de petróleo e o aquecimento, destacando que 15 dos 16 anos mais quentes já registrados ocorreram neste século. E trouxe as consequências do problema para perto da audiência ao mostrar projeções de aumento do nível do mar em várias regiões costeiras — Rio, Xangai, Amsterdã, Dubai, Lagos e Flórida — no caso de um aumento de temperatura de 4°C. Várias delas são praticamente engolidas pelo oceano.

A produção teve consultoria científica de dois pesquisadores brasileiros: o físico Paulo Artaxo, professor da Universidade de São Paulo (USP) e membro do IPCC, e o engenheiro florestal Tasso Azevedo, coordenador do Sistema de Estimativa de Emissão de Gases de Efeito Estufa (SEEG) do Observatório do Clima.

Segundo Artaxo, a opção foi por mostrar o chamado “aumento comprometido” do nível do mar caso as emissões de carbono não sejam drasticamente reduzidas até 2050. “Quisemos ir além de 2100 e mostrar o que aconteceria no longo prazo no cenário ‘business as usual’ [caso as emissões atuais sejam mantidas]. A mensagem é que precisamos agir”, afirmou o cientista. Segundo Artaxo, as projeções topográficas usadas foram minuciosas, baseadas em dados da Noaa (agência de oceanos e atmosfera dos EUA) e do Programa Internacional da Geosfera-Biosfera (IGBP).

Ao drama seguiram-se imagens da solução — ou pelo menos o que os organizadores consideraram ser a solução: recompor florestas no mundo inteiro para sequestrar carbono. Imagens de reflorestamento na China, na Austrália e na África se sucederam enquanto as atrizes Fernanda Montenegro e Judy Dench (a M. dos filmes 007) recitavam em português e inglês o poema A Flor e a Náusea, de Carlos Drummond de Andrade.

A própria pira olímpica também foi pensada com um viés de proteção ao clima. “É a primeira pira híbrida da história da Olimpíada”, brincou Meirelles em um vídeo postado pelo comitê organizador. Ela é menor do que as piras dos Jogos Olímpicos anteriores porque, segundo o cineasta, a mensagem é de redução do uso de combustíveis. “Não fazia sentido a gente chegar na hora da pira e soltar aquele tamanho de chama”.

Atrás da pira, uma escultura do artista plástico americano Anthony Howe, que lembra o sol e é movida a energia eólica, completa a mensagem: “Vamos fazer uma emissão de carbono pequenininha e vamos usar a energia solar e a energia do vento”.

Todos os atletas participantes dos Jogos plantaram sementes de árvore, que serão transplantadas para um futuro bosque no Rio. Vários atletas também têm aderido à campanha 1.5o C — O Recorde que Não Devemos Quebrar, organizada pelo Fórum de Vulnerabilidade Climática com parceiros como o Observatório do Clima, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Gestão de Interesse Público (GiP).

 

Fonte: Observatório do Clima
Foto: Olympic.org