Em fevereiro deste ano, o mundo chegou aos 1,5°C que não deveriam ser ultrapassados. Segundo a Nasa, foi o mês mais quente da história desde que se iniciaram os registros globais de temperatura, em 1880. A mudança do clima pode pôr em xeque o bem-estar da vida no planeta, trazendo grandes prejuízos à economia global e comprometendo a oferta de alimentos e o abastecimento de água. Além disso, o próprio corpo humano não suporta condições extremas de temperatura e umidade.

Se o teto de 2°C for extrapolado e o aumento da temperatura global chegar a 2,5°C até 2100, os países poderão tomar um prejuízo de US$ 2,5 trilhões no valor dos ativos financeiros. Nada menos do que US$ 3 trilhões é o investimento anual de que o planeta precisa para implementar uma economia de baixo carbono. No entanto, as estimativas da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC), que tomam o Fundo Verde do Clima como parâmetro, estacionam na casa dos US$ 200 bilhões.

Mudança do clima põe US$2,5 trilhões em risco

O Acordo de Paris, que será ratificado na semana que vem, surgiu para pôr a questão do clima nos trilhos. Apesar de estabelecer o aumento máximo da temperatura em 2°C, as contribuições apresentadas por mais de 180 países não darão conta de manter a média de temperatura abaixo disso até o fim do século.

Paris foi um divisor de águas para o clima?

Diante desse cenário, a sociedade civil e o setor empresarial também têm muito trabalho a fazer. Nós, do Instituto Ethos, sempre tivemos forte atuação na agenda do clima. No ano passado, entregamos à Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e ao ex-Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e levamos para a COP21 a Carta Aberta ao Brasil sobre Mudança do Clima 2015, com uma série de compromissos assumidos pelas empresas para mitigar os efeitos do aumento da temperatura, como reduzir as emissões de gases do efeito estufa, erradicar as práticas de desmatamento, entre outros. Também foi lançada a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, da qual fazemos parte. Trata-se de um movimento multissetorial que pretende promover políticas públicas que impulsionem o Brasil como líder da economia sustentável.

Descarbonizando as atividades produtivas
Reduzir as emissões de gases poluentes para a atmosfera, frear o desmatamento e usar fontes ‘limpas’ de energia são alternativas para manter a temperatura em níveis seguros e estáveis. Para isso, o setor privado deverá transformar o modo com que produz, aumentando a eficiência energética, incentivando o uso de biocombustíveis em suas operações logísticas, promovendo o fomento ao desenvolvimento de tecnologias que acelerem a descarbonização da economia e estabelecendo parcerias para a criação de ferramentas e mecanismos que incentivem o uso de transporte coletivo e soluções de mobilidade urbana não poluentes.

Mapear a cadeia de fornecedores e não adquirir produtos originados de áreas de desmatamento é essencial. O setor de construção, por exemplo, pode ser um grande alvo na luta pela certificação da madeira, assim como o setor alimentício, já que diversas fazendas amazonenses criadoras de gado desmatam. É preciso transformar esse cenário, pois inspecionar a procedência da madeira e dos alimentos que consumimos diariamente não é só uma questão burocrática, é uma necessidade legítima de manter a viabilidade produtiva e econômica.

O papel do setor público nisso também é essencial. Ele deve atuar em regulações que incentivem uma economia de baixo carbono, não beneficiando o modelo tradicional de produção, que não leva em conta parâmetros socioambientais em seus processos.

Setor privado e poder público devem caminhar lado a lado para superar os desafios desse tema. A agenda voluntária do setor privado, que tem tido uma participação significativa na esfera socioambiental é muito importante, mas as próprias empresas reconhecem que mudanças significativas na sociedade ocorrem efetivamente através de regulações que estimulem práticas mais sustentáveis.

O carbono como commodity
A precificação nada mais é do que uma atribuição de valor ao carbono, de modo que os preços pagos pelos bens passam a incluir os impactos ambientais por trás dos processos produtivos. Atualmente, existem três mecanismos econômicos para a taxação do carbono: os mercados de carbono, a precificação real e a precificação positiva.

Nos mercados de carbono, utilizados desde a Eco-92 e sobretudo após a ratificação do Protocolo de Quioto, uma tonelada de CO2 equivale a um crédito de carbono, que pode ser negociado internacionalmente. A redução da emissão de outros gases, que também potencializam o efeito estufa, pode gerar créditos de carbono.

A precificação real, por sua vez, é a atribuição de preço à tonelada de carbono, já adotada por diversos países, que abrange externalidades como os impactos ambientais locais gerados pela produção, pelo uso de usinas de carvão e de combustíveis fósseis, por exemplo. Seus benefícios são muitos: aumenta a competitividade das empresas e das energias limpas, além de ajudar na consolidação de um sistema tributário mais justo.

Já a precificação positiva traz a atribuição do preço da redução do carbono, e não do carbono em si. O sistema foi construído considerando basicamente o dano à economia gerado pelo aquecimento global e tem sido considerado bastante promissor em relação aos outros, já que há grandes lacunas nos mercados de carbono e entraves burocráticos à precificação real, pelo fato de cada país ter seu próprio sistema tributário e subsídios.

Dados do Banco Mundial indicam que precificar o carbono pode movimentar mais de US$ 2 trilhões na economia mundial até 2050. O México já tem dado seus passos para tornar isso realidade. Desde 2013, o país prepara uma lei para tarifar os combustíveis fósseis. Assim, o que for arrecadado será destinado a empresas que primem pela eficiência energética, desenvolvam tecnologias e melhorem o transporte público. Para quitar o imposto, o setor privado poderá reduzir sua emissão de poluentes, compensando o custo.

Vantagens de dar preço à commodity carbono
Empresas devem se preparar para precificação de carbono

No Brasil, o Ministério da Fazenda vem estabelecendo parcerias, como um projeto com o Banco Mundial conhecido como PMR (Partnership for Market Readiness), cujo principal objetivo é entender melhor as opções de precificação de carbono antes de tomar uma decisão definitiva. Apesar de o termo ser abrangente, no geral as alternativas de tarifas podem variar, já que o país pode adotar um imposto de carbono, um mercado ou uma opção híbrida.

Oficialmente, o Brasil declarou que até 2018 os resultados dos estudos em andamento sobre a precificação de carbono serão publicados, para uma implementação efetiva após 2020. Vale lembrar que, além do México, o Chile, outro vizinho, também já está tarifando o carbono emitido e outros países da América Latina também estão esboçando esquemas de precificação. Vale pensar que, se esperarmos até 2020, não seria muito tarde para o Brasil, principalmente porque a tarifação do carbono pode trazer recursos significativos para o governo.

O olhar das empresas para o clima
Com as falhas do Acordo de Paris e os impactos do aquecimento global na economia, o setor empresarial será um importante agente para manter a temperatura do planeta dentro da meta. Para isso, as companhias terão de rever seu modelo de negócio e questões estratégicas, além de promover ações efetivas para mitigar os efeitos da mudança climática, como diminuir as emissões de gases poluentes, monitorar seus fornecedores, não comprar produtos de áreas de desmatamento e desenvolver tecnologias limpas. Sendo assim, é preciso definir objetivos de longo prazo.

Na COP21, empresas assumiram publicamente compromissos de redução de sua dependência de combustíveis fósseis e, paralelamente, um maior uso de fontes renováveis de energia. No Brasil, estima-se que as empresas multinacionais e nacionais de grande porte sejam as primeiras a trilhar esse caminho — a descarbonização das matrizes energéticas já é tendência global. Vale ressaltar que grandes companhias do setor de óleo e gás já estão precificando suas emissões, o que mostra sua antecipação em relação a essas grandes mudanças no mundo. Portanto, é importante ter essas tendências em mente ao tomar decisões estratégicas de investimento.

A Carta Aberta ao Brasil 2015 e um novo GT para a ‘economia verde’
Assumir os compromissos propostos pela Carta Aberta ao Brasil 2015 é outro caminho para cuidar do clima. Em 2015, além da Carta Aberta, o Fórum Clima realizou diversos encontros e iniciativas, e reforçou, intensificou e promoveu parcerias para divulgar e aumentar a mobilização em torno da tributação do carbono: a principal delas é a IEC (Iniciativa Empresarial em Clima). A secretaria executiva da IEC é compartilhada com o Cebds (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável) e a iniciativa também conta com o CDP (Carbon Disclosure Project), o GVces (Centro de Estudos em Sustentabilidade), o Pacto Global da ONU e a Envolverde.

Nós lançamos também no final de 2015 um novo grupo de trabalho (GT) cujo foco é estimular a consolidação de uma economia para o desenvolvimento sustentável. O novo GT vem mapeando estudos, parceiros e especialistas no tema para propor um novo sistema tributário e fiscal que estimule melhores práticas socioambientais. A precificação do carbono, a logística reversa e os pagamentos por serviços ambientais são alguns dos temas contemplados pelo projeto.

 

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