Encontro defende que o desenvolvimento sustentável tem potencial para tornar-se obrigatório nas negociações entre blocos econômicos internacionais.

Entre os dias 13 e 15 de maio, o Instituto Ethos e a Fundação Friedrich Naumann, da Alemanha, realizaram em Bruxelas, na Bélgica, o seminário “Diálogo Brasil-União Europeia: Tendências e Oportunidades para a Sustentabilidade no Mercado Internacional”. O evento faz parte de um projeto de cinco anos realizado em parceria por essas organizações e tem como objetivo promover um diálogo multistakeholder em torno do tema para aprofundar as discussões sobre os interesses comuns entre o Mercosul e a União Europeia e mapear potenciais vantagens de um acordo comercial entre ambos os blocos nas questões relacionadas ao desenvolvimento sustentável.

Desde muito tempo, o Instituto Ethos vem acompanhando as negociações em torno de um acordo de livre-comércio entre o Mercosul e a União Europeia, passando inclusive a integrar um grupo de consulta sobre o tema, a convite do Ministério das Relações Exteriores.

Foi, entretanto, em meados de 2013 que o Instituto Ethos decidiu desenvolver uma iniciativa mais robusta a respeito das relações entre os blocos econômicos, levando em conta os princípios do desenvolvimento sustentável. Surge, assim, o projeto que mais tarde contaria com a parceria da Fundação Friedrich Naumann.

Nesse sentido, realizou-se na Conferência Ethos 2013, em setembro daquele ano, o módulo “Negócios Brasileiros: Conexões Transnacionais”, que teve o apoio da Caixa Econômica Federal e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e reuniu ministros de Estado e representantes de empresas com atuação no Mercosul para discutir, entre outros temas, o papel do Brasil no desenvolvimento da América Latina e o relacionamento de negócios entre o Mercosul e outros blocos econômicos.

Em novembro do mesmo ano, o Instituto Ethos e o BNDES promoveram, em São Paulo, o primeiro seminário sobre a questão. Com o tema “Diálogo Brasil–União Europeia: Negociações Comerciais e a Construção de uma Economia de Baixo Carbono”, o encontro contou inclusive com uma mesa de pronunciamentos oficiais do Ministério das Relações Exteriores do Brasil e da Divisão de Negociações Regionais da União Europeia.

O grande objetivo dessa iniciativa pioneira é gerar conteúdo consistente sobre oportunidades e eventuais vantagens competitivas tanto para o Mercosul quanto para a União Europeia na consideração de requisitos e princípios da sustentabilidade em suas relações, notadamente no acordo de livre-comércio atualmente em discussão.

Daí a realização do seminário de três dias que ocorreu em Bruxelas entre terça e quinta-feira da semana passada. Co-organizado pelo Instituto Ethos e pela unidade em São Paulo da Fundação Friedrich Naumann, dirigida por Gabriele Reitmeier, o evento reuniu representantes do Ministério das Relações Exteriores do Brasil e da Comissão da União Europeia para o acordo de livre-comércio com o Mercosul.

Estiveram presentes André Odenbreit Carvalho, ministro-chefe da Missão Brasileira na União Europeia, em Bruxelas; Lorella de la Cruz Iglesias, coordenadora das Relações Comerciais da Comissão Europeia com o Mercosul; Frank Hoffmeister, especialista no sistema da Organização Mundial do Comércio (OMC) e membro do gabinete de Karel de Gucht, parlamentar da União Europeia; Marco Antônio Fujihara, sócio-diretor da Key Associados e gestor do Fundo Brasil Sustentabilidade do BNDES; Carlos Nomoto, diretor de Desenvolvimento Sustentável do Banco Santander; e Karima Essabak, do World Forum Lille.

Tendências

Durante a primeira mesa do seminário, Henrique Lian apresentou o relatório “Uma Análise sobre a Inevitabilidade do Desenvolvimento Sustentável no Direito Internacional”, uma relação comentada de tratados, protocolos, declarações e manifestações políticas sobre o tema. “O amplo conjunto de declarações e acordos sobre desenvolvimento sustentável, ainda que, em sua maioria, não legalmente vinculantes, já obriga, tanto moral quanto juridicamente, o Mercosul e a União Europeia a considerar os princípios do desenvolvimento sustentável em suas relações comerciais, seja por obrigação moral, seja pela transformação de acordos não vinculantes (soft law) em legalmente vinculantes (hard law), pois muitos são os  tratados, costumes e princípios gerais deles resultantes”, afirmou o diretor do Instituto Ethos.

Ainda no primeiro dia do seminário, foram apresentadas as principais tendências da OMC quanto ao desenvolvimento sustentável, especialmente no que diz respeito ao sistema de solução de controvérsias. E, na principal mesa do dia, o ministro-chefe da Missão Brasileira na União Europeia, André Odenbreit Carvalho, e a coordenadora das Relações Comerciais da Comissão Europeia com o Mercosul, Lorella de la Cruz Iglesias, discutiram aspectos dilemáticos da negociação do acordo entre os blocos econômicos.

Em seguida, houve um evento público durante o qual os palestrantes apresentaram uma síntese de suas posições para uma seleta plateia composta por representantes da Comunidade Europeia, da Missão Argentina na União Europeia, da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Única) e da Agência European Union-Brasil.

No segundo dia do encontro, foram discutidos o papel e os limites de atuação dos diversos atores-chave no processo de negociação de acordos com a promoção do desenvolvimento sustentável, como o setor empresarial, governos subnacionais, parlamentos, a sociedade civil e organizações não governamentais.

A última mesa de trabalho, que contou com a participação da Única, representada por Geraldine Kutas, analisou especificamente o caso do etanol brasileiro e sua inserção na pauta do comércio global como uma das mais importantes contribuições brasileiras para o desenvolvimento sustentável.

“O sucesso de qualquer processo de negociação reside na habilidade das partes em deixar de lado suas diferenças e se concentrar nos pontos de interesse comum”, afirmou Henrique Lian, ao concluir o evento. “O desenvolvimento sustentável é um desses pontos de intersecção, embora, como é natural, haja nuances e ênfases diferenciadas nesse entendimento”, finalizou.

Nova publicação

Durante o seminário, foi lançado o livro Diálogo Brasil-União Europeia: Negociações Comerciais e a Construção de uma Economia de Baixo Carbono, que contou com o patrocínio do BNDES e também faz parte do esforço do Instituto Ethos em ampliar as discussões em torno do tema.

O conteúdo da publicação é resultado do primeiro seminário realizado para o projeto, em novembro de 2013, em São Paulo, o qual reuniu representantes de empresas brasileiras, de organismos internacionais e do governo federal para dialogar sobre a contribuição da inclusão de condicionalidades de sustentabilidade nos acordos firmados pelo Brasil para a competitividade nacional, no plano externo, e para o aprimoramento de políticas e incentivos, no plano interno.

O livro reproduz as discussões sobre os impactos e benefícios das premissas de produção e consumo de baixo carbono, a questão das compras e investimentos públicos sustentáveis e a coerência das políticas nacionais com as existentes (ou inexistentes) nos acordos internacionais, bem como a situação atual dessas discussões no âmbito da negociação Mercosul-União Europeia. Além disso, apresenta artigos de especialistas no tema convidados pelo Instituto Ethos a contribuir para o aprofundamento dessa discussão.

Por Benjamin Gonçalves, do Instituto Ethos

Legenda da foto: Da esq. para a dir., Henrique Lian, do Instituto Ethos, Carlos Nomoto, do Banco Santander, André Odenbreit Carvalho, ministro-chefe da Missão Brasileira na União Europeia, Marco Antônio Fujihara, gestor do Fundo Brasil Sustentabilidade do BNDES, e Gabriele Reitmeier, da Fundação Friedrich Naumann.
Crédito: Aline Figueiredo