Aprovada a lei, empresas não precisarão de autorização para pesquisar recursos genéticos como micro-organismos e espécies vegetais e animais.
O governo federal enviou nesta sexta-feira (20/6) uma proposta de projeto de lei ao Congresso Nacional que deve facilitar a realização de pesquisas com base nos recursos genéticos da biodiversidade brasileira, que são os micro-organismos, plantas e raízes, entre outros.
Além de simplificar os trâmites para o início de pesquisas que buscam novos produtos cosméticos e medicamentos baseados no patrimônio genético do Brasil, a proposta enviada ao Legislativo também tem o objetivo de possibilitar uma repartição mais efetiva dos ganhos com os detentores do chamado conhecimento tradicional – que são os povos indígenas, extrativistas e outras comunidades como os quilombolas, informou o governo.
Segundo a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, a regra que dispõe atualmente sobre o patrimônio genético – a Medida Provisória 2.186-16, de 2001 – é “extremamente confusa”. “Há situações críticas de 13 mil patentes paradas e baixo êxito na repartição dos benefícios. Isso poderia ser feito com muito mais excelência, e sem a desconfiança mútua dos atores do sistema. Todo mundo acusa todo mundo e há uma elevada judicialização dos processos”, explicou a ministra.
De acordo com ela, atualmente os pesquisadores têm de pedir uma autorização prévia para trabalhar com os recursos genéticos brasileiros, a qual demora em média cinco meses para sair, mas há casos em que chega a demorar oito anos. Se as novas regras forem aprovadas pelo Congresso Nacional, isso será abolido. As empresas terão apenas de fazer um cadastro para poder realizar a pesquisa. Entretanto, precisarão de autorização para que a pesquisa vire um produto final a ser comercializado. “Está dispensada a autorização para acesso com finalidade de pesquisa”, declarou a ministra.
Izabella Teixeira explicou que, pela proposta do governo, quando a pesquisa se tornar um produto, 1% dos lucros deverá ser direcionado para um fundo nacional, que posteriormente fará a distribuição entre as comunidades detentoras do “conhecimento tradicional”. “Hoje, paga-se abaixo de 1%; é livre negociação. Se é de domínio de várias comunidades, vai se pagar para o fundo da União que irá repartir isso”, acrescentou ela.
Pela proposta, a repartição dos ganhos também poderá ser feita de forma não monetária. Uma empresa que desenvolve um produto com base no conhecimento de determinada comunidade, por exemplo, pode fazer um contrato para construir uma escola ou um hospital, por exemplo, naquela localidade. “Vamos deixar as regras claras de como se poderá fazer esses contratos. Pode-se pedir uma escola, mas com transparência”, disse.
A ministra explicou que o governo não quer nenhuma instituição do setor operando fora da legalidade e acrescentou que o projeto de lei também propõe a anistia de multas já aplicadas para pesquisadores. Para as empresas, as multas podem sofrer desconto de até 90%, retroagindo aos últimos cinco anos. A legislação também cria novas multas, que variam de R$ 1.000 a R$ 100 mil para pessoas físicas e de R$ 10 mil a R$ 10 milhões para empresas.
A fiscalização, pela proposta do governo, será feita pelo Ibama e pela Marinha, em águas continentais. Serão fiscalizados o acesso ao conhecimento, sua exploração e a repartição dos benefícios. As punições irão desde multas e descredenciamento à suspensão das empresas e dos produtos por elas comercializados.
Pesquisadores estrangeiros
A ministra observou que, no Brasil, os pesquisadores estrangeiros continuam não podendo fazer pesquisas sozinhos e lembrou que há fiscalização nas fronteiras, implementada pelo Ibama. “O pesquisador tem de estar associado, por exemplo, a uma universidade brasileira. Vai fazer uma declaração dizendo o que está pesquisando e o Ministério de Ciência e Tecnologia vai saber disso. Ele não poderá sair do país com amostra”, afirmou ela.
Para o ministro de Ciência e Tecnologia, Clélio Campolina, a proposta vai evitar a biopirataria. “Sair escondido é a pior coisa do mundo. A lei vai permitir aproveitar melhor o patrimônio genético de interesse econômico, social, estratégico, político e geopolítico. Isso vai ser um salto de qualidade na pesquisa brasileira e nos resultados econômicos e sociais que pode gerar”, declarou.
O ministro do Desenvolvimento, Mauro Borges, avaliou que, com o aumento da segurança jurídica trazida pela nova lei, os investimentos em biodiversidade no Brasil, que atualmente oscilam entre R$ 20 bilhões e R$ 30 bilhões por ano, tenderão a aumentar.
A proposta de projeto de lei foi enviada ao Legislativo em regime de urgência constitucional. Teoricamente, portanto, ela tem de ser aprovada pela Câmara e pelo Senado Federal em até 90 dias. Se isso não acontecer, ela passará a trancar a pauta do Congresso Nacional. “Não abrimos mão dos pontos expostos aqui. É um tema muito complexo. Não é um assunto que todo mundo pode opinar com achismos. Esperamos uma aliança dos parlamentares em torno da aprovação”, disse Izabella Teixeira.
Por Alexandro Martello, do Portal G1, em Brasília