Por: Caio Magri, diretor-presidente do Instituto Ethos

A 30ª Conferência das Partes da ONU sobre Mudança do Clima (COP30), realizada no último mês de novembro em Belém, representou um marco decisivo nas negociações climáticas internacionais, porém, evidenciou o esgotamento de um modelo de governança centralizado e excludente, em que o poder decisório permanece concentrado nas mãos de uns poucos chefes de Estado do Norte Global. A crise climática não é apenas uma questão ambiental, mas, sobretudo, um desafio civilizatório, que exige soluções coletivas, multidisciplinares e capazes de integrar dimensões sociais, econômicas e políticas. E este desafio só poderá ser enfrentado quando forem garantidos às nações que fazem parte do bloco do Sul Global e à sociedade em geral o direito de ter voz e poder de influenciar decisões. Para tanto, é urgente uma revisão das instâncias deliberativas da ONU.

Ao fazer um balanço da COP30 fica nítida a urgência de se repensar a governança global. O modelo vigente, centrado em poucos países que ditam o futuro de 195 nações, mostra-se insuficiente diante da emergência climática e das desigualdades estruturais. É tempo de construir um novo equilíbrio, um futuro mais sustentável e menos desigual, com protagonismo efetivo do Sul Global – cujos países são os que mais enfrentarão as consequências das mudanças climáticas – e com a participação efetiva da sociedade civil e do setor empresarial. Com esta visão, o Instituto Ethos apresentou na Conferência o documento “Impacta COP30: Além do Clima”, uma iniciativa de mobilização empresarial, social e territorial com diretrizes e propostas para orientar empresas na agenda climática e socioambiental.

O Sul Global detém a chave para soluções baseadas na natureza, por meio da conservação e regeneração de ecossistemas e biomas únicos, como as florestas tropicais úmidas e as florestas subtropicais, essenciais para a regulação climática. Nesse contexto, o compromisso do Brasil em traçar seu próprio mapa do caminho é alentador. Ainda que lamentavelmente não tenhamos obtido consenso internacional sobre a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis, o Brasil pode zerar e reverter o desmatamento, até 2030, e promover uma transição justa. Ao assumir esse protagonismo, o Brasil não apenas reafirma sua responsabilidade perante o Sul Global, mas também sinaliza que é possível unir desenvolvimento econômico, inclusão social e sustentabilidade. Por outro lado, o Norte Global enfrenta limitações históricas para oferecer soluções equivalentes.

Um avanço relevante da COP30 foi a criação do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF na sigla em inglês), voltado ao financiamento de florestas perenes no Sul Global. Importante prioridade, no entanto, ainda insuficiente diante da magnitude do desafio que temos.

A nova governança internacional não pode se restringir aos governos dos Estados nacionais. A sociedade deve ser reconhecida como ator legítimo na formulação de políticas públicas globais. Da mesma forma, o setor privado deve ser incorporado não como um grupo de pressão por interesses privados, mas como um agente engajado na construção de soluções coletivas que promovam o bem-estar e a qualidade de vida.

O Artigo 109 da Carta das Nações Unidas garante a convocação de uma conferência geral que pode reformar sua governança — dispositivo que precisa ser acionado. Não é aceitável que o futuro de quase 200 nações continue nas mãos dos cinco países com assentos permanentes no Conselho de Segurança, herança do pós-Segunda Guerra. A crise climática exige voz e poder para todos os povos.

A COP30 mostrou que avanços são possíveis e revelou os limites do modelo atual. É hora de ousar, de construir para além do voluntarismo as decisões vinculantes a partir deuma governança que reflita com equidade a diversidade e complexidade do mundo. O futuro decidido por poucos não é o mesmo para todos. Ele deve ser construído por todos.