O PL 7735/2014 traz às empresas, pesquisadores e instituições agilidade e segurança jurídica para pesquisa com ativos da biodiversidade brasileira.

Por Jorge Abrahão*

A Câmara dos Deputados aprovou, na noite de 10/2, o Projeto de Lei 7735/2014, que regula o acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional associado a ele.

O PL foi enviado pela Presidência da República ao Congresso no ano passado, em regime de urgência, e cria regras e diretrizes para empresas e pesquisadores poderem, por exemplo, ter acesso a flores, frutas, folhas, raízes, animais e micro-organismos típicos do Brasil, assim como ao conhecimento das comunidades tradicionais para gerar produtos a partir desses elementos, como medicamentos elaborados com ervas. O PL aprovado também permite às empresas consolidar estratégias para a repartição de benefícios, pesquisa genética e registro de patentes.

Comparado ao marco regulatório atual (MP2186-16), o PL 7735/14 traz às empresas, aos pesquisadores e às instituições agilidade e segurança jurídica para pesquisa com ativos da biodiversidade brasileira, desburocratizando o processo de autorização de acesso a esses recursos.

Protocolo da Nagoya

Com a aprovação do PL, o Brasil terá mais chances de ratificar o protocolo de Nagoya ainda este ano, pois essa foi a condição prévia defendida pelo governo federal.

Como se sabe, o Protocolo de Nagoya é um acordo internacional que oferece estrutura legal transparente para a implementação efetiva da repartição justa e equitativa de benefícios advindos da utilização de recursos genéticos. Ele foi ratificado por 51 países e entrou em vigor em outubro de 2014. O Brasil, que possui entre 15 e 20% da biodiversidade do planeta e foi um dos principais negociadores desse documento, não o assinou. Conforme foi debatido em setembro na Conferência Ethos 360°, um dos motivos alegados era a falta de uma legislação interna mais clara sobre a biodiversidade. Na época, o Movimento Empresarial pela Biodiversidade – Brasil (MEBB) e o Instituto Ethos conseguiram reunir vários representantes que lidam com esse tema, como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o Fundação Amazônia Sustentável (FAS) para influenciar o governo federal a enviar o PL ao Congresso e os parlamentares, a votar em regime de urgência a nova lei.

MEBB e Ethos juntaram-se à Coalizão pela Biodiversidade, iniciativa formada em 2012 por várias entidades setoriais e empresas e coordenada pelo Grupo FarmaBrasil, a qual, articulada com o Ministério do Meio Ambiente, liderou a aprovação do projeto.

Destaques positivos

O PL 7735/2014 desburocratiza a pesquisa. Ou seja, as empresas e instituições brasileiras que desenvolvem produtos com ativos da biodiversidade do país já não precisam aguardar a autorização do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGen) para iniciar uma pesquisa, bastando um simples cadastro eletrônico.

Vale ressaltar que, para as instituições estrangeiras não associadas às brasileiras, o acesso ou a remessa deverá ocorrer por meio de uma autorização prévia, a ser concedida pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (para pesquisa) ou pelo CGen (para desenvolvimento tecnológico).

Além disso, haverá uma rastreabilidade na cadeia envolvendo o ativo da biodiversidade brasileira utilizado na pesquisa, isto é, o sistema conseguirá identificar desde o início da pesquisa até o desenvolvimento do produto final.

Outra medida positiva trazida pelo PL é a padronização da repartição de benefícios, pela qual os royalties serão de 1% da receita líquida obtida com a exploração de um produto acabado ou do material reprodutivo, ou poderão ser decididos por meio de acordos setoriais. Também foram definidas pelo PL a ampliação da participação da sociedade civil no CGen e a criação do Fundo Nacional de Repartição de Benefícios (FNRB).

Como será o pagamento da repartição de benefícios pelas empresas?

O FNBR é o fundo onde serão depositados os pagamentos relativos à repartição de benefícios. Baseado nos princípios da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), um programa usará recursos desse fundo para:

  1. proteger a biodiversidade e os conhecimentos tradicionais;
  2. inventariar o patrimônio genético;
  3. estimular o uso sustentável dessa biodiversidade; e
  4. manter sistemas de cultivo que favoreçam esse uso, entre outras ações.

Agora, falta regulamentar

O Instituto Ethos e o MEBB acompanham e participam das discussões desde 2012, em conjunto com a Coalizão da Biodiversidade, e permanecerão na discussão para articular com o governo e com outras entidades a regulamentação do PL 7735/2014. A expectativa dessas organizações é de que o Ministério do Meio Ambiente produza uma proposta de regulamentação consultando todos os setores interessados: empresas, comunidades tradicionais, povos indígenas, pesquisadores acadêmicos e cientistas.

* Jorge Abrahão é diretor-presidente do Instituto Ethos.