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Boas práticas de extrativismo sustentável

O Projeto Bem Diverso e a conservação da biodiversidade

10/01/2019

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Em entrevista ao Instituto Ethos, Fernando Moretti, assessor técnico do Projeto Bem Diverso da Embrapa, fala sobre o extrativismo sustentável nos biomas Cerrado, Caatinga e Amazônia.

Fernando, que participou do painel “Comércios justos e os territórios de diversidade socioambiental” na Conferência Ethos Belém 2018, também ressalta o envolvimento das comunidades no extrativismo, aborda o mercado de produtos da biodiversidade e o impacto do Projeto Bem Diverso nas políticas públicas.

Ethos: Qual o histórico das boas práticas de extrativismo sustentável nos biomas Cerrado, Amazônia e Caatinga? De que forma a promoção desse modelo de extrativismo minimiza a atuação das comunidades em atividades ilegais ou mesmo a exploração do trabalho?

Fernando Moretti: O Projeto Bem Diverso visa contribuir para a conservação da biodiversidade brasileira em paisagens de múltiplos usos, por meio do manejo sustentável da biodiversidade e de sistemas agroflorestais, de modo a assegurar os meios de vida de comunidades tradicionais e de agricultores familiares, gerando renda e bem-estar.

A partir do manejo sustentável da biodiversidade é possível contribuir fortemente com a conservação dos biomas pelo seu uso, agregando conhecimentos técnico-científicos (desenvolvidos pela Embrapa) aos modos de produção agroextrativistas destas comunidades, tradicionalmente passados de geração em geração.

Em execução desde 2016, o Projeto impulsiona uma rede de discussão que sai do tradicional conceito de preservação, exclusivamente pelo isolamento em áreas de preservação ambiental, e parte para a conservação da biodiversidade pelo seu uso a partir do resgate dos territórios e dos modos de vida das comunidades tradicionais que os habitam. Assim, o trabalho se dá com a ampliação e qualificação das capacidades locais, por meio de formações contextualizadas, associadas ao fortalecimento das organizações sociais, promovendo ainda a autonomia e o empoderamento das comunidades tradicionais e de agricultores familiares.

Fruto da parceria entre a Embrapa e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com recursos do Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF), o Bem Diverso atua em seis Territórios da Cidadania, em três biomas e com atendimento prioritário a 12 espécies nativas:

  • Bioma Cerrado
    – TC Alto Rio Pardo (MG): pequi, araticum, coquinho-azedo, maracujá do mato e veludo
    – TC Médio Mearim (MA): babaçu
  • Bioma Caatinga
    – TC Sobral (CE): sistemas agroflorestais
    – TC Sertão de São Francisco (BA): umbu, maracujá-da-caatinga e licuri
  • Bioma Amazônia
    – TC Alto Acre e Capixaba (AC): castanha-do-brasil
    – TC Marajó (PA): açaí e andiroba

“A partir do manejo sustentável da biodiversidade é possível contribuir fortemente com a conservação dos biomas pelo seu uso, agregando conhecimentos técnico-científicos (desenvolvidos pela Embrapa) aos modos de produção agroextrativistas destas comunidades, tradicionalmente passados de geração em geração.”

Ethos: Qual o panorama atual do crédito, aumento do valor e do acesso ao mercado para produtos da biodiversidade no Brasil? Que condições são necessárias para a ampliação das cadeias da sociobiodiversidade e de seu mercado interno e externo?

Fernando Moretti: Os principais desafios para o acesso ao mercado pelos produtos da sociobiodiversidade estão na agregação de valor aos produtos com retorno ao extrativista, certificação do processo de produção e a aproximação do produtor com a indústria, de forma a evitar os famosos atravessadores.

O Bem Diverso atua diretamente no relacionamento com organizações do governo e da sociedade civil, como as cooperativas e associações, de forma a promover missões aos Territórios e visitas técnicas às agroindústrias. Ao identificar os gargalos na produção das comunidades, a Embrapa proporciona a implementação de tecnologias já desenvolvidas ou permite que os técnicos desenvolvam novos mecanismos para o melhoramento dos processos, aliando o conhecimento tradicional ao conhecimento técnico-científico. A assessoria ao desenvolvimento de novos produtos também faz parte desse trabalho.

O apoio da Embrapa ainda se dá para que as organizações produtivas sejam regularizadas conforme a legislação vigente, e os produtores capacitados a partir das boas práticas de processamento e fabricação para que o produto seja o mais saudável possível e esteja ao alcance de mercados nacionais e internacionais com maior grau de exigência.

Ethos: Qual o papel dos jovens e das mulheres no extrativismo sustentável? O que tem sido feito para o empoderamento desses atores e para a continuidade do legado de suas comunidades com relação a defesa dos biomas?

Fernando Moretti: Os jovens e as mulheres têm um papel fundamental para a manutenção dos meios de vida e o desenvolvimento da produção pelas comunidades extrativistas. Para fortalecer os jovens, são realizadas oficinas de comunicação que permitem às novas gerações vislumbrar um futuro de recuperação dos biomas e de geração de renda em suas comunidades, evitando o êxodo rural. A troca de experiências e a oportunidade de compartilhar essas reflexões fortalecem a identidade de suas comunidades ao contar as suas próprias histórias.

O Bem Diverso ainda proporciona, a partir de suas atividades, o empoderamento das mulheres no âmbito rural. Elas trabalham com o extrativismo e na produção dos produtos da biodiversidade, mas ainda não reconhecem o papel fundamental que apresentam para a manutenção dessas atividades e de suas comunidades.

“Para fortalecer os jovens, são realizadas oficinas de comunicação que permitem às novas gerações vislumbrar um futuro de recuperação dos biomas e de geração de renda em suas comunidades, evitando o êxodo rural.”

Ethos: Como a inovação e a alta tecnologia podem conviver e potencializar o extrativismo sustentável e agroindústria de pequeno porte?

Fernando Moretti: O desenvolvimento dessas cadeias produtivas passa pelo melhoramento da fabricação pelas agroindústrias locais, implementação de boas práticas de produção, além do acesso na distribuição dos produtos para outros mercados nacionais e até internacionais. O objetivo é fortalecer a economia das comunidades, buscando novas possibilidades de circulação dos produtos da agricultura familiar em mercados de outras regiões. Esse é o enfoque de atuação do Bem Diverso para 2019, tanto no que se refere às tecnologias na produção e nas agroindústrias, quanto às estratégias de acesso aos mercados e financiamento.

Ao identificar os gargalos na produção das comunidades, a Embrapa proporciona a implementação de tecnologias já desenvolvidas ou permite que os técnicos desenvolvam novos mecanismos para o melhoramento dos processos. A partir de um plano de trabalho com ações para os próximos dois anos, objetiva-se atacar problemas relacionados ao processamento dos produtos da biodiversidade e do extrativismo em três frentes. A primeira se dá com a formação de multiplicadores em boas práticas de fabricação e em rotulagem de alimentos, bem como treinamento dos agentes da Vigilância Sanitária na aplicação de dispositivos legais que regulam a atuação de agroindústrias artesanais e de produtos da biodiversidade.

A atuação ainda busca a eliminação de problemas de funcionamento das agroindústrias, já que muitas se tornam ociosas e até inativas. Desta forma, há espaço para a inovação tecnológica com vistas à melhoria da qualidade, saudabilidade e segurança dos produtos, bem como para o desenvolvimento de novos produtos demandados pelo mercado consumidor. 

“O objetivo é fortalecer a economia das comunidades, buscando novas possibilidades de circulação dos produtos da agricultura familiar em mercados de outras regiões.”

Ethos: Qual o impacto do Projeto Bem Diverso nas capacidades locais e em políticas públicas? Você pode citar exemplos?

Fernando Moretti: O Bem Diverso alcança sua efetiva execução pela atuação conjunta com organizações do governo e da sociedade civil. Até o momento, mais de 40 parcerias resultaram em seis cartas de acordo implementadas com as instituições e associações locais, além de parceria com a equipe técnica para elaboração de 11 projetos executados diretamente pelos parceiros a partir da seleção em editais de licitação e fomento.

Já são mais de 1,5 mil pessoas capacitadas a partir do trabalho conjunto de pesquisadores da Embrapa e parceiros, que já implementaram 54 unidades demonstrativas de manejo e restauração para a conservação da biodiversidade dos biomas e fortalecimento dos extrativistas familiares de comunidades tradicionais.

Todas as informações geradas e sistematizadas com base nas ações do Bem Diverso compõem relatórios compartilhados com agentes públicos e atores da sociedade civil para subsidiarem a elaboração e adequação de políticas públicas associadas ao uso sustentável e conservação da biodiversidade.

Como exemplo, temos as atividades de restauração do Cerrado, no território de Alto Rio Pardo, em Minas Gerais. A semeadura direta de sementes em áreas degradadas do Cerrado para recuperar cursos d’água no bioma tornou-se modelo para uma política pública no estado com o objetivo de construir, de forma participativa, diretrizes e parâmetros a serem considerados para o uso de sistemas agroflorestais na recuperação de áreas de proteção permanente e reservas legais. Em setembro de 2018, Belo Horizonte foi sede do II Seminário “Sistemas Agroflorestais como Instrumento para Recuperação Ambiental: construindo a Normativa Mineira” com a participação de diversos atores do setor público.

“Já são mais de 1,5 mil pessoas capacitadas a partir do trabalho conjunto de pesquisadores da Embrapa e parceiros, que já implementaram 54 unidades demonstrativas de manejo e restauração para a conservação da biodiversidade dos biomas e fortalecimento dos extrativistas familiares de comunidades tradicionais.” 

Por: Edson Lopes, do Instituto Ethos

Foto: Pexels

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