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Efeitos da pandemia marcam diálogos do primeiro dia Conferência Ethos

Desigualdades, racismo e erros do governo federal estiveram presentes nas falas de especialistas

28/05/2021

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Nesta quinta-feira (27/05), a abertura da Conferência Ethos 2021 fez um panorama da atual conjuntura retomando os maus passos que nos levaram a mais de 450 mil vidas perdidas para a Covid-19. Flavio dos Santos, professor dos programas de Pós-graduação em História Comparada (UFRJ) e História (UFBA); Margareth Dalcolmo, pneumologista e pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz e Vladimir Safatle, professor livre-docente do departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo dialogaram com Caio Magri, diretor-presidente do Instituo Ethos. Este painel pode ser acessado no canal do Ethos no YouTube.

“Uma conta muito simples de fazer é que, se somos 2,7% da população global, e temos 13% dos mortos no mundo, então temos mais de 300 mil mortes evitáveis. Mortes que não foram evitadas por ausência de políticas, por manter e provocar a escassez de vacinas, pelo abandono e negação de aprendizados que já tivemos”, pontuou Magri em sua fala inicial.

O diretor-presidente do Ethos listou os efeitos da pandemia no cenário nacional. “Voltamos para o mapa da fome, regredimos de maneira rápida e profunda. O cenário colocado desnuda isso. Temos um processo de aprofundamento da pobreza”, observou.

Dalcolmo sintetizou os principais agravantes e erros cometidos para tal situação. “O Brasil poderia ter recebido a epidemia de uma maneira melhor do que fez. Temos muitos profissionais de saúde qualificados, mas a gestão brasileira não foi capaz de gerenciar isso […] Hoje vivemos o seguinte: mais de 450 mil mortes, mais de 20 milhões de casos, empobrecimento, necessidade de assistir a uma epidemia que está longe de ser controlada”, ressaltou,

 

Da esquerda para direita: Maria Sylvia, Vladimir Safatle, Flavio dos Santos e Margareth Dalcolmo

 

Como medidas que ainda podem – e devem – ser adotadas, a pneumologista e pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz indicou que a vacinação seria uma alternativa, mas segundo ela “o ritmo de vacinação é muito aquém do esperado e o Brasil errou muito porque fomos um grande celeiro de ensaios clínicos, mas não negociamos as vacinas”, como tem revelado a CPI da Pandemia.

Resgatando fatos históricos brasileiros, Safatle lembrou que “esse genocídio por negligência do Estado não é um caso único. Isso é só a expressão de uma compulsão de repetição da história brasileira, que é uma história de massacre, genocídio, exterminação, desaparecimentos que nos fundam desde o início, com o processo violento de colonização” e completou: “temos a morte como apenas a descrição numerária de um fato. Não se sabe nomes, histórias, não se cria comoção. Isso é o lugar normal da história brasileira, sempre foi assim. Criamos um processo de auto ilusão para não enxergar o quão estrutural é essa violência do Estado”.

De acordo com o professor livre-docente do departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo, “para sair dessa situação sem retornar a essa falsidade para muitos, que têm discursos que não condizem com a realidade, é preciso ter coragem de entender e avaliar o país como ele realmente é, com seus antagonismos, conflito, com o nível de destruição de violência e guerra civil não declarada que temos com relação a vários segmentos da população. Esse estado não tem como continuar dessa forma”, concluiu.

Santos, em linha com a perspectiva de proposições e possíveis caminhos de superação da atual crise sanitária disse que “esse é um momento de reflexão e diagnósticos, mas também para apontar projetos e possibilidades”.

Atento ao que vem acontecendo paralelamente e se perpetua no Brasil, o professor dos programas de Pós-graduação em História Comparada (UFRJ) e História (UFBA) destacou em sua fala as marcas do racismo no país. “Recentemente, tivemos a intervenção policial numa comunidade no Rio de Janeiro com a morte de 28 pessoas, que sabemos pouco sobre as histórias, sobre os nomes, mas temos certeza de que são pessoas negras, jovens negros. Houve sempre muita dificuldade da sociedade brasileira e do estado brasileiro de reconhecer a desigualdade racial e o racismo estrutural como elementos fundantes para qualquer projeto de sociedade brasileira”, analisou e finalizou dizendo que “nosso desafio é construir uma sociedade mais igualitária com reflexão sobre o passado histórico porque para nós, negros, o passado de mortes não acabou, está presente”.

 

Leia o posicionamento do Instituto Ethos sobre o massacre em Jacarezinho

 

No outro painel ao vivo do dia, “Como não resistir sozinhos?”, como que em continuidade ao que já vinha sendo tratado, Marina Ferro, gerente-executiva do Ethos, conversou com Maria Sylvia, do Geledés – Instituto da Mulher Negra e conselheira seccional na OAB SP. Este painel também está disponível no canal do Ethos no YouTube.

Em resposta ao apontamento feito pela explanação de Ferro, que disse: “vivemos uma pandemia que aprofundou e escancarou questões estruturantes, como a fome e desemprego, somado a isso temos um governo federal que minimiza tudo isso”, Sylvia pontuou que: “independente do governo posto, a precariedade da população negra é um dado […] Ainda no período de ditadura militar o Movimento Negro foi a público denunciar a falácia da democracia racial e delatar a letalidade da polícia brasileira”.

A conselheira seccional na OAB SP seguiu denunciando que “já no primeiro artigo da Constituição Federal consta referência a dignidade da pessoa humana, todavia para a população negra, apesar da luta que o Movimento Negro empenhou pela Carta Magna, vemos que são direitos que nos são negados (negados à população negra)”.

A representante do Geledés chamou atenção ainda para a situação das mulheres negras. “A pandemia só agravou isso, a taxa de desemprego para pretos e pardos é maior do que os que se autodeclaram brancos. A comunidade afrodescendente no Brasil é colocada em estado de fome e pobreza, tendo as mulheres e meninas negras como as mais afetadas”.

Sylvia discorreu sobre as várias implicações quanto ao momento que vivemos. “A exclusão digital é outra questão preocupante, pois há muitas crianças fora da escola pela falta de acesso a equipamentos digitais, fato que o Banco Mundial declara como preocupante, principalmente para o futuro. Há mais de 1 ano nessa crise pandêmica, vemos que ela desgraçadamente afeta os mais pobres e a resposta do Estado, principalmente para população pobre, periférica, majoritariamente negra, foi inexistente e ineficiente”, destacou e criticou, como fora feito pela pneumologista Dalcolmo, a estratégia do governo federal para imunização da população. “Essa imunidade de rebanho foi uma ação deliberada do Estado para que as pessoas se infectassem, mas a questão é que negros têm mais chances de morrer pela Covid-19 que os não-negros”.

Ainda sobre a atuação do governo, Sylvia lembrou que “a estratégia do governo de negar água para povos indígenas, de não adquirir produtos médicos para essa parcela da população e ao permitir que milhares de pessoas voltem para o mapa da fome é o genocídio”.

Após falar sobre ações que está envolvida como a campanha “Se tem gente com fome, dá de comer!”, cujo Ethos apoia,  e os atos “Fora Bolsonaro” do dia 29 de maio, ela encerrou sua fala com um pedido: “chamamos que as organizações que se dizem antirracistas pratiquem o que dizem”.

 

Por: Rejane Romano, do Instituto Ethos

Imagem: Print do evento online

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